“Dia histórico”, diz presidente da CUT sobre PLC dos motoristas por aplicativos

Fruto de meses de negociação, o projeto, considerado um marco para a classe trabalhadora, foi construído em mesa tripartite com a CUT, centrais e lideranças dos trabalhadores, além de governo e empresários.

“Hoje é um dia histórico para a classe trabalhadora, o Brasil tornou-se um exemplo para o mundo”, disse o presidente nacional da CUT, Sérgio Nobre, sobre o Projeto de Lei Complementar PLC que regulamenta o trabalho de motoristas por aplicativo. O texto foi assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na tarde desta segunda-feira (4), no Palácio do Planalto, junto com dirigentes sindicais da CUT, líderes de trabalhadores e do Ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho.

Ao destacar a magnitude desse projeto, Sérgio Nobre ressaltou que o “debate da proteção aos trabalhadores por aplicativos e plataformas é um debate mundial”.

“Esse é o primeiro caso que conheço, de um de um país que regulamenta por meio de lei, a proteção aos trabalhadores”, disse o presidente da CUT, reforçando que a categoria passará a ter direitos como em outras categorias, entre eles, à previdência, à negociação coletiva e direitos básicos.

O projeto é histórico porque cria uma nova categoria de trabalhadores – os ‘trabalhadores autônomos por plataforma’. Na prática, isso possibilitará que o setor, daqui pra frente, possa se organizar, por meio de sindicatos, e assim, ter maior poder de pressão negociação por direitos.

O texto será enviado com urgência constitucional. Câmara e Senado terão 45 dias, cada, para analisar a proposta.

Está de parabéns a classe trabalhadora. Agora é ir para dentro do Congresso Nacional para fazer deputados e senadores aprovarem o projeto

– Sérgio Nobre

A proposta é fruto de meses de negociação envolvendo o Ministério do Trabalho, representação dos trabalhadores, incluindo a CUT, e as empresas do setor. A formação do grupo de trabalho tripartite se deu pelo Decreto 11.513/2023 do Governo Federal.

O objetivo de promover proteção social, segundo o secretário nacional de Transportes e Logística da CUT, Wagner Menezes, o Marrom, foi alcançado. “O PLC é um avanço importantíssimo para a classe trabalhadora. A categoria precisava dessa regulamentação e, depois de meses de negociação e muita luta, mas com empenho da CUT e da bancada dos trabalhadores, a categoria foi criada”, disse o sindicalista.

Marrom reforçou que ao se criar uma categoria representada por sindicatos, promove-se a dignidade desses trabalhadores. “Não só na questão salarial, mas na questão social”, diz.

“O PLC vem no sentindo de promover proteção social para os trabalhadores que hoje quando têm problemas como em situações que o carro quebra ou quando o trabalhador fica doente, fica sem nenhum tipo de renda ou proteção”, explica Marrom.

Mais que todas as garantias que o projeto traz (veja abaixo os principais pontos), haverá, segundo o dirigente, uma linha de crédito especial para esses trabalhadores. “Lula, em sua fala, anunciou que será criada uma linha de crédito especifica para que esses trabalhadores possam comprar um carro mais novo, fazer o seguro, etc. Por isso, não se pode negar que houve um grande avanço em sua promessa de campanha – a de regulamentar a categoria”, disse o dirigente.

Tramitação e pressão

Assim como presidente nacional da CUT, Sérgio Nobre, o secretário de Transportes e Logística da CUT reforça que é preciso pressão aos parlamentares nos próximos 90 dias para que aprovem o projeto.

“Já estamos nos articulando, nos reunindo com lideranças dos trabalhadores e sindicatos para conversar com líderes de bancadas e cobrar a aprovação do PLC. Mas é preciso que todos os trabalhadores se emprenhem nessa pressão”, diz Marrom.

Início de uma história

Ao enaltecer a atuação sindical, Marrom reforça que a criação da regulamentação é um passo inicial de uma jornada de luta por direitos. “O Brasil hoje cria essa regulamentação dessa forma de relação de trabalho e ‘é daqui pra mais’. Vai haver avanço não só na questão dos direitos trabalhistas, mas na organização da categoria”, diz o secretário.

“Sabemos das condições precárias e da exploração que as plataformas exercem. Agora está regulamentado, não vai mais poder acontecer. Eles estão representados”, pontua o dirigente.

PLC: uma promessa cumprida

A discussão sobre a necessidade de regulamentação das relações de trabalho, em especial, dos trabalhadores por aplicativos foi tema de destaque durante a campanha de Lula a presidente, em 2022.

Portanto, o que era uma promessa agora se torna realidade. Além disso, a abertura de diálogo e negociação foi uma iniciativa pioneira no mundo. A elaboração do PLC, que é um primeiro passo no processo de organização e luta desses trabalhadores, traz pontos importantes para a garantia de direitos futuros aos motoristas por aplicativo (em transportes de passageiros como Uber, 99, etc.).

Minsitro Luiz Marinho | Foto: Ricardo StuckertMinsitro Luiz Marinho | Foto: Ricardo Stuckert

O quem vem no projeto

A principal conquista, defendida pela CUT, demais centrais sindicais e representantes desses trabalhadores é a garantia de um piso de remuneração para uma jornada de trabalho de 8 horas por dia e um valor mínimo para os custos efetivos do trabalhador como a manutenção do veículo, impostos, combustível, internet utilizada no celular e alimentação, entre outros.

Os valores definidos no PLC são de R$ 32,10 por hora trabalhada. Desse total, R$ 8,03 se referem ao trabalho em si e R$ 24,07 referentes aos custos.

No fim do mês a remuneração mínima, com base em uma jornada de oito horas será de R$ 5.649,60 para uma jornada diária de 8 horas efetivamente trabalhadas, durante 22 dias no mês. A jornada pode, no entanto, chegar a 12 horas diárias se houver acordo coletivo.

Hoje, o rendimento médio desses trabalhadores é de R$ 2.454,00, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), feita pelo IBGE. (Veja abaixo como é hoje a realidade desses trabalhadores)

Já a remuneração mínima para os motoristas deverá também acompanhar a política de valorização do salário mínimo para efeito de reajuste anual e não deverá servir de limite de ofertas de corrida pelas as plataformas aos motoristas.

Os trabalhadores ainda poderão escolher quando querem trabalhar. Também não terão vínculo de exclusividade com plataformas.

Entre os avanços estão também o reconhecimento de relação de trabalho entre as plataformas e os motoristas e não uma relação entre duas empresas. Como resultado esses trabalhadores autônomos terão regras que deverão ser seguidas pelas empresas.

Ainda sobre este ponto, o reconhecimento da relação de trabalho permite que a categoria tenha direito à organização sindical, sindicalização e contratação coletiva. Isso possibilitará que o processo de negociação continue e, ao longo dos tempos, mais direitos e melhores condições sejam conquistadas.

Outro avanço é a garantia da proteção social. O PLC prevê contribuição previdenciária custeada em sua maior proporção pelas empresas.  Haverá um desconto de 7,5% sobre o salário do trabalhador e uma complementação de 20% por parte da empresa, calculada em cima do valor-base.

Neste ponto, vale destacar que 100% desses trabalhadores estarão cobertos pela previdência. Atualmente, segundo dados do IBGE, somente 23,6% contribuem com algum instituto previdenciário

Traz ainda a previsão de responsabilidade da empresa pelos agravos à saúde do trabalhador e de promover trabalho decente.

Histórico

O GT criado em 2023 teve como objetivo elaborar propostas de “regulamentação das atividades de prestação de serviços, transporte de bens, transporte de pessoas e outras atividades executadas por intermédio de plataformas tecnológicas” em um prazo de 150 dias.

Ao final desse período (setembro de 2023), chegou-se a um acordo no subgrupo de transporte de passageiros sobre os termos que comporiam um Projeto de Lei Complementar para regular pontos da relação entre empresa e trabalhadores. De lá para cá foram feitos ajustes no texto, em diálogo com as bancadas.

A pauta dos trabalhadores foi composta pelos seguintes pontos:

  1. Regulação tributária;
  2. Prevalência dos acordos e convenções coletiva;
  3. Direitos sindicais;
  4. Negociação coletiva;
  5. Flexibilidade do trabalhador para poder definir seus horários de trabalho e descanso;
  6. Vínculo de trabalho indeterminado para trabalhadores habituais e autônomo para trabalhadores eventuais;
  7. hora logada;
  8. Seguridade social;
  9. Remuneração mínima;
  10. Transparência;
  11. Saúde e segurança;
  12. Medidas relacionadas ao exercício e processo de trabalho;

 Já os pontos que foram efetivamente previstos no PLC:

  1. Relações de trabalho;
  2. Princípios que devem reger a relação entre trabalhadores e empresas de aplicativos (trabalho decente);
  3. Piso salarial de R$8,03/hora;
  4. Cobertura dos custos R$ 24,07/hora;
  5. Jornada de trabalho efetivamente trabalhada e tempo de conexão máximo;
  6. Direito à previdência social;
  7. Direitos dos trabalhadores em situações de subcontratação;
  8. Regras para a exclusão do trabalhador ou trabalhadora da plataforma;
  9. Representação sindical e negociação coletiva
  10. Penalização para o descumprimento das regras previstas no Projeto de Lei Complementar.

Como é atualmente:

Levantamento do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) mostra como são as condições atuais de trabalho dessas pessoas. Veja abaixo:

TABELA – Indicadores das pessoas ocupadas como condutores de automóveis em atividade de transporte rodoviário de passageiros, segundo a condição de trabalho

Indicador Valor
Número de trabalhadores e trabalhadoras 721 mil
Rendimento médio mensal real habitualmente recebido no trabalho principal (Reais) R$ 2.454,00
Média de horas habitualmente trabalhadas por semana 47,9 horas
Rendimento-hora médio habitualmente recebido no trabalho principal (Reais/hora) R$ 11,80
% Contribuintes para instituto de previdência em qualquer trabalho 23,6%

Fonte: Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD- IBGE referentes ao 4º trimestre de 2022.

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